Luciana Bezerra

Foto de Thayná Bonin

Cineasta e roteirista, Luciana Bezerra nasceu na favela do Vidigal, Rio de Janeiro.  Em 1992, começou a estudar teatro no grupo Nós do Morro, participando de várias montagens como atriz, figurinista, diretora, escritora e roteirista. Descobriu nesse momento a sua paixão por contar histórias e seguiu carreira artística. Fez estágios nas áreas de assistência de direção e produção, pesquisa e colaboração em roteiros, e participou da pesquisa de elenco e oficina de atores para o filme Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles e Kátia Lund.

O ponto-chave em sua carreira como realizadora está na realização do curta-metragem Mina de Fé (2004). Rodado em 35mm, o filme já demonstra seu olhar autoral para o espaço da favela em uma temática que vai desenvolver em seguida ao colocar o “povo em cena”. O prêmio de melhor curta no Festival de Brasília e a passagem da obra por mais de dez países referendam e pavimentam a continuidade do trabalho. Em sequência participa e se destaca no longa-metragem coletivo e colaborativo 5x Favela: Agora Por Nós Mesmos (2010), produzido por Cacá Diegues com o objetivo de revelar novos cineastas. O seu episódio, Acende a Luz, no projeto é bastante criativo e se utiliza do humor para refletir sobre estereótipos da sociedade.

É autora do livro Meu Destino Era o Nós do Morro (Ed. Aeroplano), uma coleção de memórias do grupo Nós do Morro pela sua ótica como coordenadora audiovisual do projeto. Em 2012, participou da Rio Occupation London, projeto cultural das Olimpíadas de Londres que levou para a cidade artistas brasileiros a fim de criar intervenções artísticas. Nessa ocasião, Luciana criou o projeto Diário London. Foi também colaboradora em roteiros, como Praça Paris (2017), de Lúcia Murat e Tinted Glass (2017), de Shmuel Perl; e integrou a equipe de direção da série How to be a Carioca, ao lado de Carlos Saldanha, Renê Sampaio e Joana Mariani.

Nos últimos anos, dirigiu um documentário, 7 Cortes de Cabelo no Congo (2022), que recebeu o prêmio da categoria no Olhar de Cinema, em Curitiba. E estreou no Festival do Rio seu primeiro longa de ficção, A Festa de Léo (2023). 

Filmografia selecionada

A Festa de Léo (2023), em codireção com Gustavo Melo
7 Cortes de Cabelo no Congo (2022), em codireção com Gustavo Melo e Pedro Rossi
5x Favela: Agora Por Nós Mesmos (2010). Episódio: Acende a Luz
Mina de fé (2004)

//Filmes Faróis

Quais são os filmes faróis que foram importantes na sua formação como cinéfila e cineasta?

Essa é uma pergunta difícil para quem ama cinema. Para quem o cinema foi desde sempre sua janela para o mundo, para quem com certeza o cinema foi farol e apontou caminhos.  Então resolvi citar  alguns dos filmes que não só fizeram minha cabeça de jovem amante da sétima arte, mas também fizeram e fazem parte de minha multiplicação de saberes artísticos.  São eles: o conjunto de curtas do Kleber Mendonça Filho (A Menina Do Algodão; Vinil Verde; Eletrodoméstica; Noite De Sexta, Manhã de Sábado); o longa Um Trem para as Estrelas,  de Cacá Diegues; e Um Céu de Estrelas, de Tata Amaral. Estes foram os primeiros que pensei. E depois resolvi acrescentar o curta O Dia em que Dorival encarou a Guarda, de Jorge Furtado e José Pedro Goulart, Esse Mundo é Meu, de Sérgio Ricardo, Cuidado Madame, de Julio Bressane, Ladrões de Bicicletas, de Vittorio de Sica, Ligadas pelo Desejo, das irmãs Lilly e Lana  Wachowski , O Pântano, de Lucrecia Martel, e Dez, de Abbas Kiarostami – os quatro últimos como os representantes estrangeiros a se juntar numa lista de filmes que fizeram a minha cabeça e que fazem ainda hoje. Se pensarmos estamos passeando aqui pelo neorrealismo italiano em um filme de 1948, o Cinema Novo com um filme de 1964 e vamos seguir com filmes dos anos 90 até a metade do ano 2000. 

Eu iniciava meus estudos cinematográficos em 1995 com a Retomada do Cinema Brasileiro. E tinha que ter, em especial, a esperança em um cinema do futuro, e meus mentores, Rosane Svartman e Vinícius Reis, para isso me apresentaram o passado do cinema e um cinema mundo, para além da esfera estadunidense, que costumava chegar até aqui. E assim fui construindo minha própria maneira de enquadrar o mundo e contar minhas histórias.

O que há em comum nesses filmes que fizeram a minha cabeça? Personagens reais, normalmente marginalizados, negados de sua própria história que nessas obras ganham voz, corpo, espaço, sentimento, subjetividade e importância.  E são esses personagens que inspiram meu cinema e a minha vontade de colocar o povo em cena, com enfoque especial nos dramas pessoais, familiares e femininos. Aspirando eu mesma ser Farol para um cinema futuro, que se desenvolve na interlocução do desenvolvimento cultural de seu próprio país. Buscando uma identidade brasileira diversa e verdadeira.