Publicado originalmente em julho de 2011
No ano passado, Anna Muylaert estudou a obra de Stanley Kubrick. Este ano, mergulhou profundamente em Woody Allen. Antes de se firmar como realizadora, ela foi crítica de cinema – e gosta de ver filmes tanto quanto de fazer. E de escrever. Colaborou no roteiro de trabalhos de Cao Hamburger (Castelo Rá-Tim-Bum, O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias e o próximo, Xingu), Alain Fresnot (Desmundo), Roberto Moreira (Quanto Dura o Amor?) e Karim Aïnouz (Praia do Futuro).
Escreveu seus próprios filmes, desde os curtas Rock Paulista (1988), As Rosas Não Calam (1992) e o delicioso A Origem dos Bebês Segundo Kiki Cavalcanti (1995) até os premiadíssimos longas Durval Discos (2002) e É Proibido Fumar (2009). Para a revista Filme Cultura, no ano passado, Anna comentou a influência dos filmes contemporâneos sobre a sua obra:
– Acho que minhas maiores influências, desde a época dos meus curtas até os longas, são cineastas independentes americanos como Wes Anderson e os irmãos Coen, e também Woody Allen. Talvez porque sejam cineastas que trabalham com a ironia, assim como eu. Mas Gus van Sant, por exemplo, é um mestre do estilo. É impossível não aprender com ele. O bom do cinema é que, por mais que se aprenda, você está sempre começando.”
No momento, Anna está “começando” em três novos projetos. Está transformando seu telefilme Para Aceitá-la Continue na Linha numa versão longa (e com pegada mais social) para cinema, Chamada a Cobrar. O longa seguinte vai tratar de um tema que ela há muito considera, que são as babás. O filme se chama Que Horas Ela Volta? e, segundo ela, “é sobre educação”. Regina Casé vai viver a babá numa relação dramática com o menino que criou em São Paulo e a filha que deixou na Bahia. Ao mesmo tempo, prepara o projeto de Mãe Só Há Uma, história de um menino roubado na maternidade que cresce com a família trocada. Além disso, foi convidada para dirigir dois episódios da série Preamar, coordenada por Estevão Ciavatta para a HBO.
Com seus títulos quase sempre extraídos de expressões corriqueiras, Anna Muylaert vai criando uma dramaturgia bem marcante no cinema brasileiro, com personagens um tanto gauches em encontros calorosos. “Acho que estou me especializando em cotidiano”, brinca meio a sério. Mais informações sobre sua carreira, que também inclui poesia e literatura infantil, estão no seu site pessoal.
Para reeditar aqui seus filmes-faróis, Anna quis mexer um pouco na lista publicada na Filme Cultura nº 53. Refez também alguns comentários. “Essas listas são sempre móveis. Como podia não ter nenhum Kubrick ou Woody Allen?”
A seguir, os “faróis” de Anna Muylaert:
“Nem todos esses filmes me influenciaram. Mas todos são filmes que eu considero como referências.
1. Amarcord, de Federico Fellini
Eu vi este filme no Cine Bijou, ainda adolescente, e assim como no filme os personagens se encantam pela grandeza do navio Rex, eu me encantei pela grandeza do filme. Com certeza foi um grande inspirador para que eu quisesse ser cineasta.
2. Estranhos no Paraíso, de Jim Jarmusch
Este filme foi um marco no cinema pop, porque valoriza a diversão que há no tédio e no silêncio.
3. Pulp Fiction, de Quentin Tarantino
Um filme que encantou a mim e ao mundo principalmente porque rompeu com padrões de narrativa, mas tambem pela excelência da direção, diálogos e ambiente, além de ter resgatado a figura de John Travolta.
4. Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (Annie Hall), de Woody Allen
Annie Hall foi o primeiro filme em que Woody Allen trabalhou com o diretor de fotografia Gordon Willis e por isso o filme foi um turning point em sua carreira. Parece que o fotografo ensinou a ele que o cinema vai muito além do plano e contraplano. Apesar de ser uma mera comédia romântica, a partir desse filme Woody Allen levou em conta a possível dança da câmera e seu cinema mudou de patamar.
5. Fargo, dos Irmãos Coen
Considero este filme uma obra-prima dos irmãos Coen pelo equilíbrio entre crueldade e ironia, sem falar na firmeza de cada detalhe da direção.
6. Whisky, de Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll
Mínimo filme uruguaio, perfeito em sua simplicidade visual, técnica e humana.
7. Elefante, de Gus van Sant
Considero este filme uma obra-prima do grande diretor americano: original na forma de contar a história, belo na sensualidade da câmera e da direção, na escolha da trilha sonora.
8. Baixio das Bestas, de Cláudio Assis
Cláudio Assis é um dos grandes diretores de cinema do Brasil desde sua estreia em Amarelo Manga. No seu segundo filme ele consegue narrar atrocidades humanas através de um cinema que beira a poesia.
9. Madame Satã, de Karim Aïnouz
Primeiro filme de um dos nossos mais sensíveis cineastas, me abriu as portas para um cinema brasileiro cujo protagonista não é a narrativa, mas sim a sensualidade dos personagens em sua relação com a câmera.
10. Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick
Considero este um dos melhores filmes de todos os tempos, se não o melhor. O perfeccionismo de Kubrick aterriza em cada mínino detalhe, criando um ambiente fílmico que se passa em algum ponto entre o passado e o futuro, e pode ser visto mil vezes que sempre revelará novidades.”