Publicado originalmente em outubro de 2007
No dia de hoje, Bebeto Abrantes está com as antenas voltadas para Tóquio. Na sede da emissora NHK, serão divulgados os vencedores do Japan Prize, competição internacional de programas de educação. Seu doc Histórias de um Brasil Alfabetizado concorre na categoria “Educação para Adultos”. Um prêmio pode ajudá-lo a alavancar seu próximo projeto, em que pretende contar nada menos que a história do samba.
Ou melhor, “uma das muitas e possíveis histórias do samba”, como ele prefere definir a série de 12 médias-metragens destinada à TV e ao mercado de DVDs. Uma História do Samba vai se dividir em programas temáticos, relativamente autônomos, cada um fazendo sua própria viagem entre o passado e o presente do ritmo.
Bebeto tem o doc na veia. Não dirige com muita freqüência, mas já associou sua tarimba na conceituação e roteirização de projetos documentais a diretores como Sandra Werneck (Meninas, Profissão: Criança), Dodô Brandão (no premiado Três Antônios e um Jobim) e Belisário Franca (na série 7 x Bossa Nova e diversos projetos da produtora Giros). Quando dirige, Bebeto não costuma errar. Recife/Sevilha: João Cabral de Melo Neto é um primor de cinebiografia que vai fundo na evocação poética audiovisual. Até Quando?, feito em 2005 em parceria com o Observatório de Favelas e a Unicef, constitui um impressionante dossiê sobre a violência contra jovens da periferiado Rio e de Recife.
A TV tem consumido muito de sua energia criativa. Desde a época do programa Brasil Legal, que o teve entre seus roteiristas, Bebeto vem editando e dirigindo programas para o Multishow e o Canal Futura. Para a Direct TV, escreveu e dirigiu em 2001 o doc TV – Quem Faz, Quem Vê, ampla reflexão sobre a televisão brasileira que passou pelo É Tudo Verdade. Para o Discovery Kids, realizou a minissérie Eco-Aventura: Amazônia.
Fazer e pensar o documentário são uma cachaça diária para esse apaixonado que se iniciou nos anos 1980 na Iser Vídeo, produtora pioneira na conexão entre expressão audiovisual e cidadania. A título de filmes-faróis, Bebeto Abrantes apontou cinco obras que o deixaram “zonzo de felicidade e de desejos pelo cinema”. São eles:
1. Ana Cristina César – Poesia é uma ou duas linhas e por trás uma imensa paisagem, de João Moreira Salles, 1990
Curta-metragem sobre a vida e obra da poetisa Ana Cristina César. O esmaecimento e a abstração das belas imagens mostram como a escassez e a ausência (de material de arquivo e do próprio personagem do doc) podem ser um poderoso aliado do documentarista.
2. Verdades e Mentiras (F For Fake), de Orson Welles, 1974
Falso ou verdadeiro? Ficção ou documentário? Autor ou falsário? Pouco importa… O que vale é a obra, a construção da linguagem, o filme visto, a história contada.
3. 32 Variações sobre Glenn Gould, de François Girard, 1993
Uma biografia da vida e obra de Glenn Gould, construída com peças audiovisuais de tamanho, formato, tempo e linguagem bastante distintas. Esse filme abriu minha forma de entender e construir cinebiografias.
4. Salve o Cinema, de Mohsen Makhmalbaf, 1995
O cineasta iraniano explora a relação entre diretor e ator, misturando ficção e documentário. Perversidade, amor, encantamento, provocação, afinidade, todos esses elementos são discutidos no filme, a partir de um simples teste de elenco.
5. O País de São Saruê, de Vladimir Carvalho, 1966-1970
Me encantou a forma como o diretor e sua equipe, delicadamente e no tempo certo, se aproximam mais e mais do universo sertanejo do filme e, aos poucos, vão “entrando” nele. Literalmente: aos poucos, eles saem de trás das câmeras e se incorporam às imagens do filme.