Vai até este domingo, 14 de abril, na Caixa Cultural-RJ, a mostra A Luz (Imagem) de Walter Carvalho. É hora, portanto, de recordar as escolhas desse mestre quando lhe perguntei sobre os seus filmes-faróis, há quase seis anos, para o antigo DocBlog.
Além de grande diretor de fotografia e ótimo diretor, Walter Carvalho poderia ser também um brilhante crítico de cinema. Apesar de turbinados pela paixão, seus comentários sobre o assunto demonstram capacidade de análise para além dos lugares-comuns.
Sua primeira resposta à minha consulta para os Faróis foi concisa, quase telegráfica. Não satisfeito, peguei o telefone e pedi que ele comentasse cada escolha. Foi o estopim para um jorro de impressões pessoais, observações históricas e apreciações estéticas que anotei como pude. Aqui vai, portanto, um resumo inevitavelmente pobre do que ouvi:
O Balão Vermelho, de Albert Lamorisse. Fui apresentado a esse filme pelo meu irmão, quando adolescente em João Pessoa. Fiquei encantado pelo que ele detonou na minha imaginação. Quando o revi, 30 anos mais tarde, descobri que sua sedução está na ausência da palavra, numa narrativa totalmente ancorada na imagem. É cinema puro, sem o suporte do código verbal. Ajudou-me a compreender o universo da imagem.
Acossado, de Jean-Luc Godard. Godard é o mais criativo e mais jovem diretor da atualidade (e digo isso até hoje). Deveria ser currículo obrigatório para qualquer cineasta se situar na história do cinema enquanto inauguração de linguagem. E Acossado é emblemático disso.
Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha. As mesmas características e a mesma densidade do cinema do Godard se encontram em Glauber. Nenhum cineasta latino-americano foi tão seminal e estimulante como ele. Deus e o Diabo é a referência maior desse cinema. Em termos de força inauguradora, foi o mesmo que Limite, de Mário Peixoto, nos anos 1930.
Dois Homens e um Armário, de Roman Polanski. Vi esse curta do Polanski na época em que era rato de cinemateca, nos anos 1970, numa fase de efervescência do curta-metragem. Lembro que, na saída, atravessei a passarela do MAM tomado por um misto de angústia, melancolia e triunfo. Aquilo era fascinante e ao mesmo tempo tão distante de mim. O filme era como um objeto que mantinha uma face oculta, que eu não via mas era capaz de deduzir. De alguma maneira, é disso que trata o trabalho com a luz. Lembro que no dia seguinte falei obsessivamente do filme com meus colegas na ESDI.
Chico Antonio, o Herói com Caráter, de Eduardo Escorel. Considero esse documentário único porque ele ecoa no tempo o caráter quase casual do encontro de Mário de Andrade com o cantador de coco. Escorel também estava na região e decidiu procurar Chico Antonio. O filme revela/sintetiza/evoca/transcende o registro do imaginário literário, simplesmente juntando peças do passado e do presente. É um exemplo de como nasce um filme. Sinto-me completamente indefeso diante dele.
É muito esquisito deixar de fora filmes como O Homem de Aran, de Robert Flaherty, e os nomes de Joris Ivens, Eisenstein, Fellini, Buñuel, Bressane, Antonioni… Blow-Up, por exemplo, é um dos filmes que me influenciam/inspiram até hoje. Matou a Família e Foi ao Cinema foi fundamental para mim. E Os Fuzis? Difícil, muito difícil essa tarefa.
Na verdade não são cinco filmes, mas um conjunto de filmes que me levaram para a loucura de fazer filmes. Inclusive meu irmão (Vladimir).